quarta-feira, outubro 31, 2012

Da alegria



 

Ela sempre suspira durante uma alegria
como uma criancinha
a quem a alegria em excesso causa espanto.

Estar muito alegre pode assustar
e mesmo deixar alguém amedrontado.

A alegria e sua curva transcendental
são poderosas
e fazem pouco de nós.

segunda-feira, outubro 29, 2012

Afrodite



No fim desse caminho
céu prateado e cheiro de Afrodite
inclinação que faz o passo leve
por onde escorrem cantos de sereias
e a dança envolve todos os sentidos
o fim pode chegar de repente
como num poço sem fundo
habitado por um ser sem olhos e sem nome
tecendo uma teia de lâminas.

sexta-feira, outubro 26, 2012

Receita II



O momento
é vidro prestes a se estilhaçar
renda de filamentos.

Mas se valer a pena
doçura e dengo regeneram
os cristais mais finos.

quarta-feira, outubro 24, 2012

Banco de dados



 
O banco de dados do mundo
começa com o arquivo da gênese
escorrendo por entre os dedos do Senhor.

Todo homem tem seu tempo
mas nem todos espremem seu suco até o fim
e o que resta é um arquivo morto
ou quase isso.

Os ônibus lotados datam de mais de um século
mas só nos novecentos
os homens começaram a pendurar-se nas janelas
(e as mulheres só no carnaval).

As mulheres preferem olhar os ônibus de outras janelas
e estão sempre buscando alguma coisa
: maçãs, serpentes, vestidos, homens extraviados
os filhos mortos serenamente vivos em suas fotos
até que no jardim nasçam lápides novas
datadas de algum dia sem memória
que a humanidade não quer lembrar
em shows de rock e a ópera da temporada.

Enquanto a criação descobre as alegrias
da science fiction e do cinema desdobrado na platéia
o mais é pasto até o fim dos tempos
em cada porta do imenso casarão
onde habitam os que até agora conseguiram escapar.

segunda-feira, outubro 22, 2012

Atacama



Nem sei por que
viveria  feliz no Atacama
deserto com suas miragens
mentiras visuais
porém ilusões benditas.

É possível viver de ilusão
conheço tanta gente assim!

quinta-feira, outubro 18, 2012

Raízes




Imagem sem nome de autor



Voando a bordo do vento
alçam asas provisórias
papéis alados
notícias
ilusões
recibos e garantias
cartas rasgadas e folhas
intenções
e regalias.

Voam véus
cortinas
sonhos
e aves tontas na vidraça.

No chão
imóveis
raízes
responsáveis pelos galhos
e lenhos de nosso alento
ensinam
sem dizer nada
que na vida
nem tudo voa no vento.